quarta-feira, 4 de fevereiro de 2015

O som do mundo.


Soundlapse from FruitBonus on Vimeo.


O mundo está cheio de música. Há os sons que não existem maisque estão perdidos na memóriaMeu amigo Severino Antônio, poeta de voz mansa, sugeriu aos seus alunos que um passo primeiro para a poesia seria chamar do esquecimento os sons que um dia ouviram e que não se ouvem mais. A música do realejo, o canto do carro de bois, o apito das fábricas, das locomotivas, o “din-din” dos bondes, o canto dos galos, o repicar fúnebre dos sinos, o crepitar do fogo nos fogões de lenha, a gaita do sorveteiro, a buzina das charretes.

Parece que a poesia fica guardada nos sons que não mais se ouvem. Há também os sons da cidade, os gritos dos vendedores, o vozerio nas feiras, a algazarra das crianças ao sair das escolas, os bate-estacas das construtoras, o canto dos pardais, os rádios ligados dos trabalhadores, o latido ardido dos poodles... E há os sons da natureza: o assobio do vento, o barulho da chuva, os mantras das cachoeiras, o canto dos pássaros, dos sapos, dos grilos ( tantos hai-kais sobre os grilos...), dos galos, o barulho das ondas...

Todo homem – até mesmo o rico – é poeta entre os quinze e os vinte anos. A nova educação deverá fazer do homem um poeta em todas as idadessem que lhe seja necessário escrever versosViver a poesia é muito mais necessário e importante do que escrevê-la” – assim disse Murilo MendesPoesia é música. A primeira poesia que se ouve é uma canção de ninarDepois, é a música do mundo.

4 comentários:

  1. Me identifico muito com o som. Me encanta. Som é texto. E o mundo está cheio de sons. Realmente há sons que não voltam mais, e que tem seu valor quando surgem no nosso dia-a-dia. De forma inesperada, no meio do "caos ruidoso" que é a vida urbana, realmente se tornam poesia para nossos ouvidos – um som de infância, um som de natureza ou a voz de alguém que já se foi.

    Isso não quer dizer que os sons cotidianos na cidade não possam encantar nossos ouvidos. Depende da maneira como você lê os sons ao redor. O vídeo é uma prova de que a nossa criatividade ao combinar sons nem um pouco melódicos – em determinado ponto de vista – pode provocar um encantamento antes inimaginável. Ouvir o mundo de maneiras diferentes nos abre infinitas possibilidades.

    Dos ruídos se fez música - das palavras se fez poesia. O mundo é como um instrumento musical: dá várias possibilidades de sons. A sensibilidade diante deles pode produzir resultados encantadores. Já dizia o poeta:

    “Nunca deixar de ouvir,
    Com outros olhos!” (Fernando Anitelli)

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    1. Excelente, Lucas. Como diz um poeta amigo meu, 'o silêncio é uma banda de música'.
      =)

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  2. Fernanda Merege -13hrsdomingo, março 22, 2015

    Amei tanto o texto, quanto o vídeo! Sempre adorei música, menos pelo som em si do que pelos sentimentos e das sensações que ela pode provocar em nós. Acho impressionante como a música é capaz de influenciar como estamos nos sentindo, ou de enfatizar um sentimento. Uma coisa que sempre reparo em filmes é a trilha sonora, pois às vezes pode atrapalhar, e às vezes pode cair como uma luva, algo que me dá um prazer imenso. E acho muito bonito o que o texto e o vídeo mostram, como qualquer coisa pode ser música. Apesar de ter plena consciência disso, volta e meia me vejo surpresa com a beleza de alguns sons e o poder que eles têm. E espero que eu possa continuar a me surpreender com isso, porque é um sinal de que eles continuam me inspirando tanto quanto sempre. Essa postagem me deixou genuinamente feliz :)

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  3. Que sinfonia! O barulho dos telefones tocando, o elevador subindo, os sons da cidade transformaram-se em melodia cotidiana. A partir do olhar dos produtores da montagem o que era normal ganhou ares de novidade. Muito bom!

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